LETÍCIA SORG. COM JULIANA ELIAS
A resposta de qualquer pai ou mãe, questionado sobre o que deseja para os filhos, está sempre na ponta da língua: “Só quero que sejam felizes”. A frase não deixa dúvidas de que, numa sociedade moderna, livre de muitas das restrições morais e culturais do passado, a felicidade é vista como a maior realização de um indivíduo. Até governos nacionais se viram na obrigação de fazer algo a respeito.
Neste ano, a China e o Reino Unido anunciaram a intenção de medir o grau de felicidade de seus habitantes. Os governantes, espera-se, querem o melhor para seu país, assim como os pais querem o melhor para seus filhos. Mas a ambição de sempre colocar um sorriso no rosto pode ter um efeito contrário. A pressão por ser feliz, condição nada fácil de ser definida, pode acabar reduzindo as chances de as pessoas viverem bem.
“Quero que meus filhos sejam felizes, mas também que encontrem um
propósito e conquistem seus objetivos”, diz o americano Martin Seligman,
considerado o mestre da psicologia positiva. Depois de estudar a busca da
felicidade por mais de 20 anos, ele afirma ser tolice elegê-la como a única
ambição na vida. Ex-presidente da Associação Americana de Psicologia, professor
da Universidade da Pensilvânia, pai de sete filhos e avô pela quarta vez,
Seligman reviu suas teorias e concluiu que é preciso relativizar a importância
das emoções positivas. “Perseguir apenas a felicidade é enganoso”, diz Seligman
.
Segundo ele, a felicidade
pode tornar a vida um pouco mais agradável. E só. Em seu lugar, o ser humano
deveria buscar um objetivo mais simples e fácil de ser contemplado: o
bem-estar.
Em seu novo livro, Flourish (Florescer),
Seligman apresenta cinco fatores fundamentais para viver bem. A felicidade
(emoções positivas), quem diria, seria apenas um deles, ao lado de propósito,
realização, engajamento e relações pessoais (saiba mais no quadro abaixo).
“O que eu pensava dez anos atrás era parecido com o que Aristóteles dizia, que
havia um único objetivo final, a felicidade”, afirma o americano. Mas ele
observou que, muitas vezes, decidimos fazer coisas que não melhoram exatamente
nosso humor. Como, por exemplo, ter filhos.
O que
importa para viver bem
O psicólogo Martin Seligman afirma
que a felicidade é só um dos elementos responsáveis por nosso bem-estar.
Conheça os outros
Para casais estabelecidos, que sonham com uma família, a notícia de uma
gravidez costuma levar pai e mãe às nuvens. O nascimento da criança é motivo de
celebração, com direito a vídeo do parto e incontáveis fotos. Mas, segundo
pesquisas de opinião, a alegria dura pouco, e nossa percepção de felicidade
diminui nos primeiros anos de vida das crianças.
Uma provável explicação para o
resultado seria que, ao responder ao questionário, somos influenciados por
fatores comezinhos, como as noites maldormidas e as fraldas sujas. De qualquer
forma, apesar disso, as pessoas continuam a ter filhos porque, mais do que
alegria, eles dão sentido a nossa existência.
A ideia de que a vida é mais do que a busca de sensações positivas não é
nova. Ao escrever que a felicidade é o motivo por trás de todas as razões
humanas, Aristóteles não defendia viver apenas em busca de emoções positivas e
prazeres.
Para o filósofo grego, ser feliz era praticar a virtude. Mesmo Thomas
Jefferson, que alçou a felicidade a um direito na declaração de independência americana,
em 1776, não defendia ser feliz acima de qualquer coisa, como queremos hoje.
No
livro A democracia na América, Alexis de Tocqueville afirma que,
para Jefferson, a felicidade envolvia conter desejos para obter objetivos de
longo prazo. O que muitos afobados de hoje resistem em fazer.
A noção de que a felicidade é um objetivo tangível – e não um horizonte
que norteia nossas ações – só se tornou dominante na sociedade moderna. Sua
base vem do iluminismo, que colocou o indivíduo – e suas necessidades – no
centro das preocupações humanas.
É dessa época a teoria utilitarista, que
defendia a busca da maior quantidade de felicidade para o maior número de
pessoas. Para o jurista e filósofo inglês Jeremy Bentham, a felicidade era a
vitória do prazer sobre a dor.
A partir do século XVIII, começou a ganhar força
a ideia de que temos de evitar as sensações negativas. O principal problema
dessa filosofia de vida é basear-se em princípios muito frágeis e efêmeros: as
emoções. “Os sentimentos positivos e negativos não podem ser entendidos como
fins em si mesmos”, afirma a pesquisadora norueguesa Ragnhild Bang Nes, do
Instituto de Saúde Pública do país.
As emoções negativas, embora desagradáveis, podem servir de alerta para
o indivíduo de que há um problema que precisa ser resolvido ou prepará-lo para
experiências futuras. Como uma espécie de teste, elas parecem desafiar nossos
planos de viver bem. A publicitária mineira Cristiana Guerra sabe como poucos o
que é enfrentar situações difíceis e ser obrigada a superá-las.
Cinco
caminhos para o bem-estar
|
Dicas
da New Economics Foundation para conquistar uma vida melhor
|
Pesquisas feitas com
veteranos de guerra mostram que a maioria – cerca de 80% –Cristiana, de transformar em algo positivo um evento traumático. Um fator
importante para conseguir superar a dificuldade é o otimismo.
“Os otimistas são
mais esperançosos, resilientes, saudáveis e têm um desempenho melhor do que o
esperado no trabalho, na escola e nas relações”, afirma Martin Seligman. “Eles
pensam que os efeitos das dificuldades são temporários, e suas causas,
específicas, delimitadas. E que a realidade é mutável.”
É consenso entre os pesquisadores que grande parte da felicidade, assim
como a personalidade, é determinada já no nascimento. “A genética explica quase
metade da variação da felicidade”, diz Ragnhild Bang Nes, do Instituto de Saúde
Pública da Noruega. Mas, se a felicidade já está inscrita nos genes, não
podemos alterá-la? Segundo Martin Seligman, é possível aumentar a duração e a
intensidade das emoções positivas, mas a melhoria esbarra num teto: a
personalidade de cada um. O conformismo, então, é o que nos resta? Não,
responde Seligman. Para ele, a principal vantagem da teoria do bem-estar é
permitir a qualquer um, independentemente de sua personalidade ou condição de
vida, avançar para uma situação melhor.
Como viver bem dependeria não só das
emoções positivas, mas também de outros quatro fatores, cada um pode encontrar
seu próprio caminho. “Minha razão para negar um lugar privilegiado para a
emoção positiva é a libertação”, afirma o psicólogo em seu livro. “A visão de
que a felicidade está ligada ao humor condena 50% da população do mundo, que é
introvertida, ao inferno da infelicidade.”
Na teoria do bem-estar, ou do
florescimento, quem não é “para cima” pode compensar adicionando propósito e
engajamento à própria vida. Por esse raciocínio, nem todo mundo conseguiria ser
exatamente feliz, mas todos podem viver bem.
Saber disso tira uma tonelada de ansiedade de nossos ombros. Em vez de
tentar se adaptar a outro jeito de ser, de buscar o bem-estar em terras
longínquas, é possível cultivar um jeito próprio de viver bem.
Especialistas chamam de “estado de fluxo”, termo criado pelo psicólogo húngaro
Mihaly Csikszentmihalyi. Nele, nós nos fundimos com o que fazemos. Não
interessa a atividade, o importante é que ela desafie nossa capacidade e nos
mantenha ocupados.
Uma pesquisa inédita (leia os
resultados no quadro abaixo) encomendada pela Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo (Fiesp) revelou que 61% acreditam que sua felicidade
depende de si mesmos. A opinião é corroborada por estudos científicos, que
mostram que a personalidade é o que mais influencia a felicidade.
A ciência
discorda, contudo, da importância que os brasileiros dão a alguns fatores
externos, como o dinheiro, especialmente para quem já tem uma boa situação
financeira. Nesse caso, estudos sugerem que o dinheiro só faz diferença se o
aumento de renda for só seu, e não de todos a seu redor.
“Para os mais ricos,
felicidade é estar mais alto no ranking do que seus pares”, diz o pesquisador
tailandês Nick Powdthavee, de Cingapura, e autor deThe happiness equation (A
equação da felicidade), 2010. Mas Seligman alerta: “Quem se baliza pela
comparação social é menos satisfeito com a vida do que aqueles que levam em
conta valores individuais”.
É importante também saber como gastar seu dinheiro.
Um estudo da Universidade de Chicago analisou nove categorias de produto e viu
que apenas uma, a do lazer, estava ligada à felicidade. Seu efeito positivo
parece estar ligado ao aumento do contato social. “O dinheiro tem uma relação
positiva com a felicidade, mas esta é pequena se comparada com fatores não
monetários, como as relações sociais”, afirma Powdthavee.
No livro Felicidade: lições de uma nova ciência (BestSeller,
2008), o economista britânico Richard Layard coloca as interações sociais – de
amizades ou amorosas – como os fatores externos mais importantes de nossa vida.
Em sua pesquisa, as pessoas que começam a ver seus amigos quase todos os dias
reportaram, ao final de um ano, um nível de felicidade 0,161 mais alto (num
total de 7). Isso é mais que o efeito do primeiro ano de casamento, responsável
por um aumento de 0,134 na felicidade do casal.
O tipo de amizade também é
importante, e é melhor que seus amigos sejam bem-humorados. Segundo o médico e
sociólogo Nicholas Christakis, autor do livro O poder das conexões (Campus,
2009), a felicidade é contagiosa – assim como a depressão.
Cada amigo feliz de
nossa rede aumentaria em 9% nosso próprio bom humor – enquanto um amigo infeliz
causaria uma queda de 7%. Mas a solução não seria sair correndo atrás de muitos
amigos.
Em tempos de Facebook, Orkut e outras redes virtuais, em que alguns
expõem orgulhosos listas com mais de 2 mil “amigos”, é importante saber qual é
sua verdadeira e sólida base social. Segundo o biólogo evolucionista Robin
Dunbar, o cérebro humano só é capaz de lidar com 150 amizades ao mesmo tempo.
No grupo mais íntimo – e mais importante –, estariam só cinco pessoas. Mas não
existem regras.
Há quem consiga melhorar seu bem-estar criando relações
melhores com mais pessoas e há também quem se sinta confortável com cinco. “Uma
das principais sabedorias é respeitar a característica de cada um”, diz a
psicóloga Cláudia Giacomoni, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Obtido o desejado nível de bem-estar, muitos podem perguntar se a
conquista seria duradoura. Embora parte dos brasileiros cite a juventude como
um fator importante para se sentir feliz, estudos mostram que nosso bem-estar
aumenta com o passar dos anos.
É verdade que a infância é uma fase propensa a
uma grande dose de felicidade, mas o mesmo pode ser dito da terceira idade.
Pesquisadores descobriram que, com o envelhecimento, há um aumento de
bem-estar. As dificuldades surgem mesmo durante a vida adulta, repleta de
desafios, pressões e inevitáveis frustrações.
A explicação para essa evolução
estaria nas mudanças internas, e não em nosso entorno. Com o passar do tempo,
nosso comportamento muda. As pessoas mais velhas brigam menos, sabem como
solucionar um conflito, controlam melhor suas emoções e aceitam mais os
infortúnios. Há várias teorias sobre por que isso acontece. Laura Carstensen,
professora de psicologia da Universidade Stanford, afirma que os mais velhos
sabem o que realmente importa e, por isso, focam no essencial. Com isso,
aliviam a pressão pela felicidade imediata e se aproximam do bem-estar.
Como
diz o historiador Richard Schoch, autor do recém-lançado A história da
(in)felicidade, quando a felicidade está ligada a algumas condições, deixa
de ser um direito de todo ser humano e se torna um privilégio de poucos. Ele
diz que basta que tenhamos nascido para termos o direito e a capacidade de ser
feliz. Para que esse objetivo não pese sobre nossos ombros, em vez de nos lançarmos
numa incessante busca da felicidade – muitas vezes infrutífera –, deveríamos
apenas descobrir como viver bem, a nossa própria maneira.
Fonte: revistaepoca.globo.com
Atendimento psicológico na Clínica Gênesis em Cabo Frio.
Telefone para marcar consulta: 22 2643-6366
Nenhum comentário:
Postar um comentário