segunda-feira, 15 de abril de 2013

O Discurso da Minoria (o povo)

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A complexidade pela qual a sociedade cada vez mais se torna, constrói a seu favor ou contra grupos de pessoas que emitem certas opiniões, sendo que estas na medida do tempo passam por uma seleção que procura ratificar o mais provável para o desenvolvimento de todos. Essa escolha de discursos, claro, perfaz um emaranhado de detalhes no qual o fim é aquilo mais procurado: o poder. Pois, a busca incessante de controle move de maneira incessante cada uma das pessoas tanto na micro quanto na macropolítica e assim a fala de cada de um é reavaliada pelo grau de poder que ela emane.
 O mais interessante é que na nossa época contemporânea se abriu uma procura de preencher todos os campos sociais, não porque há uma ausência, ou seja, carente de poder, e sim ao contrário, requer o poder porque este já o tem e almeja uma elevação. Essa modo de proceder está bem explicado no comentário de Heidegger sobre o pensamento de Nietzsche, que de acordo com ele pode ser denominado de a filosofia da vontade de poder. Heidegger cita no ensaio “A Sentença de Nietzsche: Deus está morto”:

Podemos observar que o estabelecimento conformador é afastado do pensamento da vontade de poder, porque o fator primordial concerne na condição de conservação-elevação e assim deseja incessantemente aumentar ainda mais o campo de poder existente em si.
 Uma forma interessante de exemplificar isso concerne em imaginarmos duas células onde uma mais fraca, quase morta, sofre fagocitose por outra mais saudável e isto não a mata, pois fortalece a ambas já que o âmbito de poder se elevou, ocorrendo uma ampliação de suas potencialidades. Ainda mais, porque Nietzsche na explicação dessa sua “doutrina” indica que não é somente o ser vivo que almeja vontade de poder, e sim todo o seu corpo, suas células, querem o querer, visto que toda a vontade é repleta de poder e todo o poder se movimenta na vontade. Nesse caminho, Nietzsche em Além do Bem e do Mal escreve que “em nós repousa várias almas”.
 E precisamente por causa dessa variedade anímica que carregamos em nossos corpos, ficamos em aporia pela pergunta já levantada por Spinoza e reafirmada por Nietzsche: o que pode o corpo? Alcançando o pretendido por esse artigo: a crise da identidade. Pois, se almejamos incessantemente o poder, como podemos afirmar que aqui expressa o que nós somos em nosso cerne? Tanto porque a palavra crise indica aqui a ruptura de uma constituição, não mais fixar-se num ponto de definição para que algo seja o que é. Esse fato do que se é, o ocidente se notabilizou em preencher a partir de certo ideário da identidade, quer dizer, permaneceu inserido num projeto social que dentre outras coisas formulou o que viria a ser o humano. Se não me engano, Derrida no artigo “A Mitologia Branca”, explicitou o que viria a ser essa identidade que o ocidente instituiu como sendo o ser humano “normal”: homem-branco-adulto-europeu-cristão-hétero-casado-trabalhador-sano. Este ser com esses atributos poderia explanar seu discurso de ordem e poder que os demais rigorosamente não podiam nada objetar, visto que esses demais estariam à margen e seu discurso seria o da minoria.
Entretanto, após essa quebra da identidade o século XX compareceu proeminente como o “século das revoluções” e vimos lutas de diversos tipos: mulheres, negros, proletários, índios, colônias independentes, etc. Sendo que na virada e entrada do século XXI, deparamos com a força de outro setor colocado à margem: os homossexuais. 


No Brasil, particularmente, o campo de atuação se tornou cada vez mais forte, inclusive a parada gay em São Paulo atraiu e atrai enorme número de participantes, gerando receita à capital e aos poucos conseguiram leis que garantiram o benefício para qualquer cidadão, por exemplo, o casamento civil. Provocando a ira da ala mais conservadora, não somente porque ganhou um benefício, mas porque aquele padrão idealizado pelo ocidente se mostra cada vez mais insensato e repleto de vazio de significado. Em decorrência disso, uma ação reacionária chega ao absurdo de proclamar o “orgulho hétero”, uma mera tentativa de se fazer vítima de algo que foi durante muito tempo ridicularizado pelos setores sociais. Se lermos o escrito até aqui, chegamos a correspondência do que aqui e sempre está em jogo é o poder. Esses que proclamam o “orgulho hétero” percebem que diante da crise da identidade daquele âmbito pelo qual se podia reclamar alguma coisa já não persiste força alguma, pois o prevalecimento concerne, desde o século passado, à diferença.
Esse termo compareceu com ímpeto determinante na filosofia recentemente e ele procura justamente desconstruir os padrões normativos orientados pelo ocidente, já que se tornou amostra o fato de serem vazios de conteúdo, ou seja, não há mais nada do que a não afirmação daquilo que nos apresenta. Nisso comparece de maneira retroativa um esbravejar de que há uma permissibilidade abusiva, não há mais regras, valores, sentidos, etc.
Enquanto, na verdade, o que acontece é afirmação dos campos fora daquele padrão, não que tem de ter um assumir por completo o outro, mas que o outro seja afirmado naquilo que ele é e não no que ele “deve ser”. Não há uma moralidade formalista na qual inserimos a pessoa, a moral se dá agora na correspondência de um ao outro, no nosso mero cotidiano. O contexto torna-se o referencial.
Assim, é desnecessário alguém proclamar que tem orgulho de ser hétero, porque a priori todo mundo é… da mesma forma, sair por aí com na camisa estampado 100% branco é inválido, pois, a etnia branca está no setor padrão da sociedade e com isso a reivindicação por uma auto-aceitação deve vir é de outras etnias, porque elas precisam a todo momento se afirmar, já que seus feitos de sucessos são examinados com suspeita. Sem falar no campo religioso, que diante do sincretismo, agora aparenta que a defesa é perguntar se o indivíduo acredita em deus, não importando a sua religião. Quando na verdade, como Deleuze escreveu, as pessoas que perguntam isso não querem saber sua resposta a isso realmente, e sim se segue ou não a moral da dita sociedade. Portanto, há em cada discurso uma fonte de poder que procura suplantar as demais e nesse caminho só vai se tornar cada vez mais propício uma relação entre ambos quando o pensamento conseguir visar não a identidade, mas a diferença e nisso, deixar espaço para os discursos tanto na sua maioridade quanto na sua minoridade.
HEIDEGGER, Martin. A Palavra de Nietzsche: “Deus está morto”. Trad. Marcos Antônio Casanova. Natureza Humana. Vol. 5(2): 471-526. jul-dez. 2003: São Paulo.

Fonte: www.filosofiadodesing.wordepress.com


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